É possível resolver a crise climática, mas interesses econômicos e a falta de vontade política estão no caminho.
Não podemos enfrentar a crise climática sem combater a corrupção.
O financiamento internacional para medidas de mitigação e adaptação às mudanças climáticas, como energia renovável, transporte sustentável e abrigos contra inundações, deverá atingir mais de US$ 100 bilhões por ano a partir de 2020. Além disso, cerca de US$ 600 bilhões por ano serão gastos por meio dos orçamentos nacionais.
Esses recursos correm o risco de serem perdidos e não chegarem onde devem devido à corrupção. Os países especialmente vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas geralmente são também aqueles que apresentam níveis mais altos de corrupção no setor público. Em vez de melhorar a vida das pessoas, os fundos climáticos podem ser desviados ou desperdiçados em projetos que beneficiam poucos, e não a sociedade como um todo.
Hoje, 9 de dezembro, é o Dia Internacional Anticorrupção. Neste ano, na mesma data está acontecendo a conferência climática mais importante do mundo: a COP25, em Madri, na Espanha.
Nem sempre foi feita a relação entre clima e corrupção, mas infelizmente os dois temas estão profundamente interligados.
RISCOS DE CORRUPÇÃO E INFLUÊNCIA INDEVIDA EM SETORES-CHAVE
O mundo precisa tomar medidas cruciais rumo a um futuro mais sustentável, protegendo as florestas, melhorando o transporte sustentável e desenvolvendo fontes de energia renováveis. Medidas como essas envolvem setores com riscos particularmente altos de corrupção, como os da construção civil, indústria extrativa e energia.
O Banco Mundial estima que entre 20% e 40% dos recursos aplicados no setor hídrico são perdidos devido a práticas corruptas. Percentuais semelhantes se verificam nos ramos de transporte e energia. Em alguns setores, isso é exacerbado por atividades criminosas. Entre 15% e 30% da exploração de madeira no mundo é ilegal. Nos principais países que exploram madeira, essa taxa pode chegar a percentuais de 50% a 90% do volume de toda a produção.
A influência de grandes corporações também impede que medidas sejam tomadas para solucionar a crise climática. Um relatório recente mostra que as cinco maiores empresas de petróleo e gás do mundo gastaram mais de US$ 1 bilhão em publicidade e lobby relacionados ao clima apenas nos três anos após o Acordo de Paris.
DEFENSORES AMBIENTAIS EM RISCO
Onde a corrupção prospera e o estado de direito é fraco, aqueles que se levantam contra crimes ambientais estão arriscando suas vidas. As taxas de mortalidade entre ativistas ambientais têm aumentado constantemente nos últimos 15 anos. Desde 2002, mais de 1.500 pessoas — agricultores, ativistas de ONGs, advogados e jornalistas — foram mortas por defender a preservação do meio ambiente e suas terras.
Quando denunciar injustiças se transforma em algo perigoso, torna-se mais difícil responsabilizar poderosos que se sentem seguros para seguir ameaçando ativistas.
CORRUPÇÃO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: O QUE PRECISA SER FEITO
A corrupção prejudica o meio ambiente e retarda o progresso em direção a todos os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
Para que a ação contra a mudança climática seja eficaz, precisamos urgentemente mudar de perspectiva e intensificar os esforços em direção à transparência, responsabilização e integridade.
Informações sobre lobby e financiamento de campanhas devem ser tornadas públicas. Precisamos ser capazes de rastrear como o dinheiro influencia a política climática — especialmente o dinheiro gasto pelas indústrias de combustíveis fósseis e por outras grandes indústrias.
As autoridades presentes na COP devem garantir oportunidades iguais de participação na política climática. Isso significa evitar conflitos de interesse e garantir que interesses de todos os setores, bem como que cidadãs e cidadãos comuns tenham acesso às tomadas de decisão.
PROTEGER O ESPAÇO DA SOCIEDADE CIVIL E OS ATIVISTAS AMBIENTAIS
Devemos proteger aqueles que protegem o meio ambiente e acabar com a impunidade de crimes contra eles. Leis que protegem os direitos humanos e denunciantes devem ser desenvolvidas e adequadamente aplicadas. A intimidação, a violência e a criminalização de ativistas precisam terminar. Também precisamos de acesso confiável às informações, canais seguros para denunciar corrupção e crimes ambientais, e leis para proteger os denunciantes de forma integral e efetiva.
As vozes das pessoas afetadas pela ação climática devem ser ouvidas em todas as etapas de desenvolvimento das políticas públicas — desde sua elaboração, à implementação e avaliação. Devemos criar e proteger espaços para a participação civil porque o envolvimento da sociedade é essencial para a tomada de decisões eficazes e sustentáveis.
São as ONGs, pessoas, ativistas e a sociedade civil como um todo que podem realizar o controle social e exigir responsabilidade dos governos e empresas em suas ações contra as mudanças climáticas.
Um futuro sustentável só será possível se protegermos os fundos climáticos da corrupção e garantirmos que a política climática global atenda aos interesses de todas as pessoas e do planeta, não apenas a poucos interesses particulares.
Este artigo foi originalmente publicad0 em 9 de dezembro de 2019, pelo Medium da Transparência Internacional – Brasil e replicado posteriormente neste blog.