Nesta terça-feira (15), o Procurador-Geral da República, Paulo Gonet, promoveu o arquivamento da petição 12.061, apresentada pelo deputado federal Rui Falcão (PT), em fevereiro de 2021, que motivou decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Dias Toffoli, em fevereiro de 2024, de investigar a Transparência Internacional (TI) por alegações infundadas de que a organização teria se apropriado de recursos públicos oriundos de acordos de leniência assinados por autoridades brasileiras. A decisão do PGR aponta a carência de sustentação comprobatória, com ausência de fatos concretos e elementos mínimos que indiquem ocorrência de prática criminosa. O arquivamento também assinala a incompetência do ministro Dias Toffoli como relator do caso.
Desde 2018, a Transparência Internacional é alvo de campanhas difamatórias no Brasil, baseadas principalmente em fake news de que a TI receberia ou administraria recursos de multas de corrupção no país. A desinformação é fomentada por ações e declarações caluniosas de autoridades públicas de alto escalão, grandes empresários que confessaram esquemas de macrocorrupção e seus advogados, além de redes de blogs partidários e milícias digitais. A partir de 2021, os ataques evoluíram para o assédio legal, envolvendo a entidade e sua equipe em múltiplos procedimentos judiciais e administrativos, em instâncias e órgãos diversos. Os procedimentos foram frequentemente marcados por heterodoxias e ilegalidades, como interrogatórios policiais abusivos, supressão de instâncias, negativa de acesso e omissão de documentos, desconhecimento de pareceres técnicos, vazamentos seletivos e ameaças.
Os ataques à Transparência Internacional no Brasil, como em outras partes do mundo, são resultado de nossas ações expondo a corrupção e comprovam a relevância do nosso trabalho confrontando interesses poderosos. Mas isso jamais pode ser normalizado e tolerado. A liberdade e a segurança de ativistas e outros profissionais que atuam em nome do interesse público, como jornalistas investigativos, são elementos fundamentais de uma democracia”
François Valérian, presidente da Transparência Internacional
Proteção do espaço cívico
A decisão do Procurador-Geral da República é extremamente importante, mas ainda é preciso ir além para fazer cessar os processos difamatórios e o assédio judicial contra a TI no país, que são apenas um exemplo dos ataques que tentam, sistematicamente, intimidar e calar ativistas e jornalistas brasileiros. É fundamental, portanto, que o Brasil priorize o debate sobre a defesa do espaço cívico e mecanismos legais de proteção ao assédio judicial.
A Transparência Internacional vem atuando em diversas partes do mundo contra o fenômeno crescente do assédio judicial. No ano passado, a organização alcançou uma vitória expressiva com a aprovação, pelo Parlamento Europeu, de uma lei inédita contra o assédio judicial a entidades e indivíduos atuando em matérias de interesse público, como a luta contra a corrupção, a defesa dos direitos humanos e da democracia. A “Lei Daphne” foi batizada em homenagem à jornalista maltesa Daphne Caruana Galizia, que respondia a mais de cinquenta processos judiciais quando foi assassinada em 2017. A nova legislação europeia introduz diversas salvaguardas para combater o que se convencionou chamar de SLAPP, a sigla em inglês para litígio estratégico contra a participação popular (Strategic Lawsuit Against Public Participation).
No Brasil, a TI se aliou à Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI) para promover uma campanha pela aprovação de uma legislação brasileira anti-SLAPP. Em julho deste ano, as duas entidades, junto com o diretor da Fundação Daphne Caruana Galizia e filho da jornalista assassinada, Mattew Galizia, estiveram em reunião para tratar do assunto com o presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco. No encontro, o presidente se comprometeu a priorizar o debate e aprovação de uma lei contra o assédio judicial a ativistas e jornalistas no Brasil.
Os ataques constantes jamais conseguiram calar a Transparência Internacional nos mais de cem países onde lutamos contra a corrupção. Não será diferente no Brasil. Ao contrário, reforçamos nosso compromisso com a causa anticorrupção pelo que ela fundamentalmente significa: uma luta por direitos”
Bruno Brandão, diretor-executivo da Transparência Internacional – Brasil
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