Aprovado no plenário do Senado nesta quarta-feira, o chamado pacote anticrime proposto pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, traz alguns avanços para a luta contra a corrupção no país. Elas, no entanto, ainda são bastante tímidas em relação à agenda de reformas que o país necessita. O ano está próximo de terminar com pouco a se comemorar no Legislativo sobre esse tema e muito a se lamentar, dada a coleção de retrocessos que se viu ao longo de 2019.
Alguns avanços observados no projeto aprovado foram a criação de um sistema de denúncia e de proteção a denunciantes e o endurecimento da possibilidade de perda de bens de pessoas condenadas por crimes de corrupção — o chamado “confisco alargado”, recomendado pelas principais convenções internacionais anticorrupção. Ambas as propostas trazem elementos sugeridos pelo pacote de 70 proposições legais desenvolvidas por especialistas liderados pela Transparência Internacional e Fundação Getulio Vargas, lançado em 2018. No entanto, os textos aprovados das duas medidas se mostraram limitadas se comparadas às originais. O pacote aprovado no Senado avança ainda trazendo novas regras para o instituto da delação premiada — que tem sido fundamental no Brasil, principalmente para apuração da grande corrupção — de modo a deixar mais claro o seu funcionamento e aperfeiçoar garantias.
Histórico — Inicialmente batizado como pacote anticrime e anticorrupção, o segundo adjetivo foi pouco a pouco caindo em desuso. Desde o início, seu foco foi muito mais voltado à questão da segurança pública e aspectos penais, com poucas medidas realmente dirigidas ao enfrentamento da corrupção. No processo de tramitação, a dimensão anticorrupção se desidratou ainda mais. Já de saída ocorreu, por pressão dos parlamentares, o desmembramento de uma das principais propostas, a criminalização do Caixa 2 — cujo texto tomou como referência a Medida 20 das #NovasMedidas contra a Corrupção.
O ano começou, portanto, com grandes expectativas para a agenda anticorrupção e termina com saldo ruim. No início de 2019, havia esperança de avanços expressivos a reboque de uma eleição em que predominou o discurso anticorrupção e a promessa de reformas.
Ao contrário, deputados e senadores aprovaram, de forma célere e sem discussão com a sociedade, medidas que dificultam o combate à corrupção. Os exemplos mais eloquentes são a Lei de Abuso de Autoridade, que por ser muito genérica pode servir para intimidar procuradores e juízes, e as modificações na Lei dos Partidos e Lei Eleitoral, que reduzem a transparência partidária e abrem brechas para desvios de finalidade e aumento significativo dos gastos eleitorais.
Futuro — A sociedade brasileira já se organizou e apresentou um conjunto amplo de propostas e extensamente debatido por especialistas. As Novas Medidas contra a Corrupção vão além das ações repressivas e têm forte ênfase na prevenção, na desburocratização e melhoria de processos públicos, transparência e acesso à informação, responsabilização do setor privado, cooperação internacional e recuperação de ativos, entre outras abordagens. Caberá em 2020 ao Congresso assumir de fato seu papel e responder aos anseios da sociedade, promovendo as reformas que podem realmente atacar as raízes da corrupção sistêmica no país.
Esta nota foi originalmente publicada em 13 de dezembro de 2019, pelo Medium da Transparência Internacional – Brasil e replicada posteriormente neste blog.